Sobre o dia dos namorados
Pensei umas 20 vezes, e resolvi falar só um pouquinho de amor romântico, já que está terminando um dia dos namorados (e não vou discutir as razões do dia existir, nada de papo brochante sobre o bicho papão do capitalismo).
Vou falar pouco porque tive pouco. (Também não vai rolar papo chato de inexistência do amor romântico, estou falando do que eu vi.)
Quem se esforça para ter um pensamento analítico gosta de pensar em explicações, razões, justificativas para tudo. Existe até uma tese de um filósofo chamado Donald Davidson que diz que o que causa uma ação é a mesma coisa que a justifica (favor dar um desconto nisto pois não sou filósofo).
É intrigante pensar no que causa e justifica as ações que estão por trás deste comportamento que chamamos comumente de amor. Quando criança, achava um absurdo que dedicassem tanto tempo a fazer músicas sobre amor, quanto tem tanta coisa tão ou mais interessante que isso acontecendo no mundo. Incluindo sapo caindo na lagoa, que a dupla Vitor e Leo botou numa música desafiando um produtor musical que alegou que nada que não fosse dor-de-cotovelo amorosa venderia na cena sertaneja universitária (estava errado).
Toda essa seletividade dos artistas e insistência num só tema era algo que carecia de explicação. Quando li em 2006 a autobiografia do meu herói intelectual Bertrand Russell, notei que, quando ele listou as três "paixões" que governaram sua longa vida, ele botou amor antes de busca pelo conhecimento e compaixão pelo sofrimento da humanidade. Nesta época eu estava na UnB, pós-adolescente. Ouvia Renato Russo adaptando Camões, falando da ferida que dói e não se sente. Lia Shakespeare fazendo referência a "uma estrela para todo barco à deriva, cujo valor é desconhecido embora sua altura seja conhecida" (minha porca tradução para versos do soneto 116).
Até que tudo fez sentido. Foi numa tarde, em Porto Alegre, que eu entendi do que toda essa gente estava falando. E entendi por que muitos trocariam 10 anos de vida e de aprendizado por alguns meses disso. Não que seja uma droga, é uma oportunidade de deixar a fronteira de íntima solidão que nos é dada junto com o ar que nos invade os pulmões ao nascer. Para mim, não durou muito. E doeu quando foi embora. Minha reação foi ficar grato, e esperar que encontre novamente qualquer dia, semana, mês, qualquer ano, qualquer década dessas que talvez eu tenha pela frente.
Galileu viu as crateras da Lua e as manchas no Sol porque tinha um novo instrumento à mão para auxiliar seus olhos, a luneta. Eu só entendi todas essas metáforas quando vivi a experiência por mim mesmo: ganhei a minha luneta.
Parabéns a todos vocês que neste dia podem se alegrar de não apenas ter a luneta, mas também por poder olhar para sua Lua incansavelmente, eternamente enquanto durar.