Discurso do orador
Colação de grau em Biologia, UnB – formandos 1º/2009. Patrona: Cynthia Kyaw. Paraninfa: Heloísa Sinátora Miranda.
Você já se perguntou por que motivo os diamantes valem tanto?
Será que o descobridor do diamante pensou que “uma pedra tão cara a meus olhos tem que valer os olhos da cara”?
A maioria dos mortais não conseguiria distinguir um diamante de um pedaço de vidro. Mas há motivos para dar mais valor ao diamante que ao vidro:
Podemos citar a raridade dos diamantes, ou sua idade (que geralmente excede um bilhão de anos), podemos citar sua bela capacidade de refratar a luz, e outras características que fazem os diamantes serem pedras singulares. Condições de alta temperatura e pressão são necessárias para fazê-los crescer, e eles têm a maior dureza entre todos os materiais que conhecemos. Eles são o produto de uma história singular.
Em oito de agosto de 2005, às nove horas e quarenta minutos, eu me encontrava sentado no chão nem sempre limpo do corredor de salas de aula conhecido como “corredor da morte”. (Quem diria... aqui biólogos são formados no corredor da morte.) Em 20 minutos teríamos nossa primeira aula de Citologia, a primeira aula do nosso curso de graduação em ciências biológicas. Ao meu lado, começando uma conversa acanhada, típica de quem se depara com um estranho, estava uma pessoa que mais tarde se tornaria um dos mais caros amigos que eu poderia querer.
Cada um dos colegas aqui presentes tem histórias similares para contar o que aconteceu nos últimos anos em meio ao concreto desta universidade sem muros.
O motivo de estarmos reunidos aqui é que passamos pelas condições ideais que fazem crescer biólogos. Nossos mestres nos pressionaram, e junto a nossas famílias, amigos e amores, nos acalentaram na exata temperatura de seu afeto, atenção e paciência.
O que fizemos durante esses anos? Aprendemos, por exemplo, que os mesmos átomos que fazem um diamante fazem também a estrutura que sustenta nossos corpos; e esses átomos nasceram no cálido coração das estrelas. Aprendemos que para cada líquen, para cada musgo, para cada barata, também existe uma história.
Ideias, e não concreto, são o material mais duro que sustenta esta universidade. Se trouxemos nossos corpos até aqui, foi por força das ideias que amamos: sonhos, projetos, desejos, cercados de ideias. Na profundidade do tempo e na vastidão do espaço, encontrar um lugar dedicado a ideias, entre elas a história natural dos seres vivos, é uma coisa maravilhosa por si só. O fato de que não ficaremos aqui eternamente só torna tudo mais precioso.
Não, não foi perfeito. Alguns disseram adeus, e voltaram no dia seguinte. Outros disseram “até logo” e se foram para sempre. Mas são justamente as imperfeições, as impurezas, que dão cores exuberantes aos diamantes; então não lamentemos por elas, são também parte de nossas histórias singulares.
Um biólogo olha para flores coloridas, e vê uma história de sedução entre dois grandes reinos vivos. Vê num lago uma completa economia da natureza; numa doença, uma batalha de egoísmos inconscientes; e numa lágrima, uma amostra do berço em que ele mesmo despertou.
Viver estudando o que vive é tanto assistir a uma sucessão de espetáculos quanto uma experiência autobiográfica. Estamos lendo um livro em que nós mesmos somos personagens, e nos emocionamos profundamente ao ler e escrever juntos esta história singular.
Eu não trocaria o que vivi com vocês nem por todos os diamantes do mundo.
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Eli Vieira
Escrito em abril de 2009.
Lido na noite de 10 de setembro para os formandos biólogos da UnB.