Richard Ebeling, ex-presidente do think tank liberal americano FEE, diz de sua experiência pessoal com Friedrich Hayek que
“com frequência ele usava humor autodepreciativo em suas memórias sobre seus conflitos e debates com [John Maynard] Keynes e outros. Às vezes ele dizia ‘bem, durante uma das minhas famosas derrotas...’”
Para resumir o conflito, Hayek era um liberal que fez um famoso alerta à sociedade britânica, na obra “O Caminho da Servidão”, sobre seguir os passos soviéticos no excesso de Estado do pós-guerra, fase em que os britânicos optaram pela social-democracia que vigora até hoje.
Keynes, um dos pais do Banco Mundial, enxergava um papel maior para o Estado comparado a Hayek, não vendo problema em o Estado gastar para estimular a economia pelo lado da demanda.
Um grande pensador não se desespera de ser derrotado politicamente, como ilustra a brincadeira de Hayek sobre ter sido derrotado por Keynes. Porque a derrota política não equivale a uma derrota intelectual. A plateia das boas ideias costuma ser uma minoria de razoáveis que com frequência não são contemporâneos. Não é uma plateia bem distribuída no espaço, mas é bem distribuída no tempo. É a arquibancada do tempo, que observa o gol sendo feito depois que quem chutou a bola já morreu.
E por que Keynes venceu a batalha política? Não me considero capaz de dar a resposta completa, mas desconfio que tem tudo a ver com dar ao Estado um protagonismo político que ele tinha perdido com o fracasso do planejamento central da economia na União Soviética. Quer crescer em instituições regadas a impostos, como as universidades? Defenda o Estado. Simples assim.
O projeto liberal é colocar ao máximo de volta na caixa de Pandora o mal necessário da criação do Estado, o bandido estacionário. Quando filmes retratam criminosos extorquindo “dinheiro de proteção” de comerciantes e trabalhadores, estão retratando a origem do Estado e dos impostos. Assim como nebulosas são berços de estrelas, o caos do Rio de Janeiro na luta de gangues, milícias e traficantes é um berço de Estados.
A diferença entre liberais e anarcocapitalistas é que os primeiros não abandonaram o “necessário” em “mal necessário” e, ao observar esses berços de Estados, concordam com Hobbes que sem o Leviatã a vida é curta, bruta e sórdida.
A origem dos Estados é espontânea, pois deriva de elementos fundamentais da natureza humana e da escassez de recursos. É primeva. O projeto liberal é educacional, civilizatório, paciente, de longo prazo. O presente sempre é cheio de antiliberais, que têm pressa de impor seus valores sobre os outros. Mas o futuro, enquanto houver racionalidade e conhecimento da natureza humana — este é o conhecimento que evita que liberais virem revolucionários sangrentos como os socialistas —, é liberal.
P.S.: Não leiam coisa demais no fato de eu escrever Estado com E maiúsculo. Só faço isso para diferenciar de estado, como lamentável nome novo que inventaram para províncias para seguir o exemplo americano, em que as colônias realmente funcionavam como Estados separados. Também sigo essa regra gramatical para enfatizar minha aderência à ideia do “mal necessário”.
boa